Portugal: 60% dos vistos de procura de trabalho são emitidos no Brasil

Seis em cada dez vistos de procura de trabalho concedidos pelo governo português foram emitidos pelos postos consulares no Brasil. Criado para fomentar a migração regular e suprir a falta de profissionais em Portugal, o novo visto teve o período de aplicações aberto em novembro de ano passado. De lá até a metade de março, 2.865 imigrantes obtiveram o documento. Desses, 63,73% foram aprovados no Brasil, segundo dados confirmados ao Agora Europa pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.

Mesmo com a promessa de facilitar o acesso ao mercado de trabalho para quem ingressar no país, estrangeiros enfrentam barreiras para utilizar o visto em solo português. Foi o lançamento do novo visto que trouxe a certeza que Magno Danilo Freitas e Silva, de 25 anos, natural de Tocantins, buscava para imigrar.

Desde que Magno iniciou o planejamento para deixar o Brasil com a esposa, no início de 2022, Portugal se destacou como o local mais acessível para brasileiros em pesquisas realizadas na internet. No entanto, o engenheiro civil não queria se mudar como turista e enfrentar o longo processo de regularização no país por meio do processo de Manifestação de Interesse (MI), com um prazo médio de dois anos para o recebimento da residência. O lançamento do visto de procura de trabalho foi a oportunidade que esperava.

O profissional solicitou o documento no final de novembro e recebeu a aprovação em meados de janeiro. No dia 2 de fevereiro, desembarcou em Portugal com a sensação de segurança de um visto em mãos. Poucos dias depois, no entanto, o tocantinense viu que o documento não seria tão útil como pensava: “Parece que o governo esqueceu de avisar as empresas e o próprio governo que chegariam ao país estrangeiros para procurar trabalho com esse visto”, desabafa o brasileiro.

A dificuldade começou nos postos do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), local para realizar a inscrição em busca de uma vaga de trabalho. Segundo o imigrante, os funcionários do órgão desconheciam a existência do visto. Além disso, Magno teve o atendimento negado em diversos locais: “Fui no IEFP de Coimbra, Lamego, Vila Nova de Gaia, Porto e Caldas da Rainha, ninguém sabia”, relata Magno.

Para ser aceito pelo instituto, o tocantinense percorreu centenas de quilômetros em três semanas. O imigrante conseguiu realizar a inscrição somente em Torres Vedras, cidade localizada a 170 quilômetros de Coimbra, onde ele reside.

Depois de superar a etapa inicial, outra surpresa: as empresas para as quais Magno mandava currículo não conheciam ou não aceitavam o visto: “Fui eliminado em quatro vagas diferentes por conta disso”, relembra o brasileiro.

Depois de muitos nãos, Magno teve que recorrer ao que milhares de brasileiros fazem em Portugal: ingressar com uma Manifestação de Interesse junto aos Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). De acordo com o tocantinense, essa foi a única maneira encontrada para não perder uma oferta de trabalho na área de telemarketing: “Ou seja, o visto serviu apenas para passar na imigração tranquilo. Aqui, não serve pra nada. Eu não sabia que era assim, se soubesse tinha me preparado psicologicamente para isso”, desabafa o brasileiro.

Apesar dos contratempos, no entanto, Magno disse estar gostando do país. Agora, o brasileiro espera conseguir uma Autorização de Residência (AR) para poder trazer a esposa, que ficou no Brasil: “Aqui sinto segurança, as cidades e os prédios são bonitos, e vamos poder viajar, como gostamos”, deseja o imigrante.

Semanas de espera por documentos essenciais

Assim como Magno, a gaúcha Samira Bento, de 20 anos, imigrou para Portugal com o visto de procura de trabalho em mãos no dia 25 de janeiro. A realidade encontrada no país, porém, também foi diferente da prometida pelo governo português.

As regras em torno do novo visto de procura de trabalho preveem menos burocracia na obtenção dos documentos necessários para trabalhar no país. Com isso, o imigrante já chegaria com o Número de Identificação Fiscal (NIF), equivalente ao CPF do Brasil, e o Número de Inscrição na Segurança Social (NISS) atribuídos. Os dois documentos são exigidos pelos empregadores para realizar a contratação de um funcionário em Portugal.

O primeiro desafio, no entanto, veio para conseguir o NIF. Samira precisou recorrer ao que outros imigrantes fazem por desespero: pagar para alguém ser o representante fiscal. A exigência de que um cidadão residente em Portugal seja o representante é feita pelo órgão das Finanças para conceder o documento.

Como ao chegar no país os imigrantes muitas vezes não conhecem alguém para assinar como representante fiscal, acabam contratando um advogado para dar andamento no processo. A jovem desembolsou 50 euros para obter o número, que é gratuito e essencial para abrir conta no banco, trabalhar e alugar um imóvel.

Depois, foi a vez de tentar dar entrada no número de segurança social, NISS. Samira conta que realizou diversas tentativas, em diferentes postos de atendimento de Lisboa e da região de Montijo, na margem sul do rio Tejo.

A jovem só teve sucesso após muita insistência durante quase dois meses: “Consegui só no dia 17 de março, por isso ainda não tive como procurar emprego nesse tempo”, explica Samira. A brasileira, que escolheu Portugal pela segurança e “está gostando muito do país”, diz que agora está buscando oportunidades de trabalho nas áreas de atendimento ao público.

Já o namorado de Samira, que imigrou com a gaúcha, não enfrentou problemas para obter os documentos. Apesar de o casal ter ingressado junto com a documentação: “Em 15 dias saiu tudo e ele já arrumou emprego em um restaurante”, relata a brasileira.

O que diz o governo

Agora Europa perguntou aos órgãos do governo sobre o motivo de o NIF e o NISS não terem sido atribuídos aos imigrantes juntamente com visto. Os ministérios envolvidos no novo processo de visto também foram questionados sobre o desconhecimento do instituto de emprego sobre o novo processo, além de como está sendo feita a comunicação aos órgãos públicos e a divulgação às empresas. Até o fechamento desta reportagem, no entanto, nenhuma resposta foi obtida.

Sobre a necessidade de pagamento para a confecção do NIF, a Autoridade Tributária (AT) respondeu ao Agora Europa que, desde julho do ano passado, não é mais necessário um representante fiscal, que geralmente faz a cobrança dos valores. No entanto, se o documento é emitido sem a assinatura de um representante fiscal, o NIF não pode ser utilizado em atividades necessárias para um residente no país, como a abertura de conta bancária.

 

Fonte: Agora Europa

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